Ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello depõe à CPI da Pandemia; assista
19/05/2021 11:41 em Politica

Ex-ministro da Saúde é questionado sobre possíveis interferências do presidente Jair Bolsonaro na compra das vacinas e sobre uso de cloroquina

 

Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia ouve agora o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, uma das oitivas mais aguardadas da CPI. 

Contando o período em que ficou de forma interina à frente do Ministério da Saúde, ele foi o ministro que por mais tempo coordenou os esforços do governo federal no combate à pandemia do novo coronavírus, entre maio de 2020 e março de 2021. 

Originalmente, o depoimento de Pazuello estava marcado para 5 de maio, mas acabou transferido para esta quarta depois que o general da ativa do Exército Brasileiro afirmou ter entrado em contato com duas pessoas que testaram positivo para a Covid-19.

Pazuello é o primeiro convocado pela CPI a contar com o benefício de poder ficar em silêncio quando for questionado pelos senadores se entender que há o risco de autoincriminação, medida concedida pelo ministro do Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Resumo da CPI da Pandemia:

País não é obrigado a seguir posições da OMS

Pazuello afirmou que sua gestão à frente do Ministério da Saúde usava as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para amparar suas decisões. 

"A OMS e da OPAS estavam presentes diariamente conosco no Ministério, mas eles não impõem nada para nós. Não somos obrigados a seguir nenhum tipo de de orientações, como soberanos", disse.

"Eu sempre me posicionei da mesma forma. [A favor das] medidas preventivas, incluindo o distanciamento social necessário em cada situação, era minha posição em todas nossas ações de comunicação."

Ele disse que as orientações seguidas no país eram do ministério, não da OMS. "A OMS dá uma posição. Cabe a nós decidirmos como vais ser no Brasil." 

Defesa de medidas não farmacológicas

O ex-ministro afirmou que, em todas as situações, sempre defendeu a importância das medidas restritivas contra a Covid-19, como o distanciamento social.

"Sobre a imposição de medidas restritivas, eu vejo uma discussão sobre o que quis dizer o STF. Na realidade, o que fica claro é que os prefeitos e governadores estão à frente das medidas restritivas", opinou Pazuello.

"Nós apoiamos todas as medidas que eles tomaram. Se um governador, independente da visão ideológica, achava que precisava desta medida, eu apoiava no que ele precisava. Eu via as ações acontecendo e cabia a mim, naquele momento, apoia-los de forma plena em qualquer situação."

Pazuello diz que gostaria de ter se reunido mais com Bolsonaro

Questionado sobre a frequência dos encontros com o presidente, o ex-ministro disse que ela era "menor do que ele gostaria".

"Acredito que a relação com o presidente poderia ser maior ainda, mas os cargos e agendas são complicadas. Eu o via uma vez por semana ou a cada duas semanas", afirmou.

"Se pudesse voltar atrás, teria ido mais vezes conversar com ele."

Convite inequívoco do presidente da República

Questionado sobre a forma como foi chamado para integrar a equipe do Ministério, Pazuello afirmou que o convite do presidente Jair Bolsonaro foi direto e inequívoco: "é para vir".

"[O presidente] me deu a missão de não deixar haver perda de continuidade nas ações de combate à pandemia (...) Como 'trocar a roda do carro com o carro andando'", disse, se referindo à transição do comando da pasta de Luiz Henrique Mandetta para Nelson Teich. 

"Conseguir montar uma equipe rápida e ela ser comprometida não é simples. A ideia do presidente era [eu] vir, trazer as pessoas que precisasse do Exército, e tocar a transição. Em 90 dias, seriam substituídos os militares e, depois, [o então ministro] Teich poderia tocar sozinho."

Pazuello também afirmou que conheceu o presidente na brigada de paraquedistas do Exército, na década de 1980, e, ao longo da minha vida, cruzou com ele em várias situações, mas tinha apenas uma "relação de amizade simples", sem proximidade.

Autonomia para formar equipe na Saúde

O ex-comandante da Saúde afirmou à CPI que durante a gestão de Nelson Teich, quando ele ocupou o cargo de secretário-executivo do Ministério, os únicos funcionários que indicou foram os 15 oficiais do Exército que, com ele, compunham essa área da pasta.

Depois, ao assumir como ministro interino, Pazuello disse que teve "100% de autonomia" para formar sua equipe. 

Perguntado sobre dificuldades técnicas, ele citou como exemplo o home office de grande parte dos servidores, mas disse que nunca sentiu resistência a seu comando. 

"Não houve uma passagem de função técnica como imaginamos. Tínhamos apenas 11%, 12% das pessoas trabalhando no Ministério, muitos estavam de home office em todas as secretarias", afirmou Pazuello. 

"No início encontrei poucas pessoas, depois fomos chamando o pessoal de volta. Foi uma relação muito boa, com o pessoal trabalhando muito, sem hora. Inclusive, elogiei bastante a estrutura na minha saída."

'Me considero apto para exercer cargo na Saúde'

O primeiro questionamento do relator da CPI ao ex-ministro foi sobre suas qualificações para ocupar tanto os cargos de secretário-executivo quanto o de ministro da Saúde. Em sua resposta, Pazuello relembrou parte de sua atuação militar, quando disse ter sob seu comando uma série de estruturas  de Saúde, como hospitais de campanha.

"Só no comando da base logística do Exército, eu tinha um hospital de campanha nível 3 da ONU. No meu comando, recebemos o nível 3, de prontidão máxima, permitindo desdobramento completo em qualquer lugar do mundo", afirmou.

"Sobre gestão e liderança, acredito que seria perguntar se a chuva molha perguntar se um oficial general tem competência de gestão e liderança. Se não tivermos, tem que começar do zero nossa instituição", continuou.

"Me considero, sim senhor, plenamente apto a exercer o cargo de Ministro da Saúde e lembro que tivemos, nas últimas duas décadas, 4, 5 ou 6 ministros que não tem absolutamente nada com ligação da Saúde", continuou, dando como exemplo os ex-ministros José Serra e Ricardo Barros.

"[Para] ser o ministro da Saúde, ou qualquer ministro nesse nível, tem que ter assessoria técnica, capacidade de ouvir, sensibilidade para tomada de decisão e decidir rápido porque todos os dias vidas eram pedidas."

Crise de Manaus foi desafio inimaginável

Sobre a crise de Saúde em Manaus, no começo de 2021, que resultou na morte de dezenas de pessoas por falta de oxigênio, Pazuello afirmou que esse foi um "desafio maior do que qualquer um poderia esperar". 

"Vi e vivi o impacto somatório de dois fatores: o surgimento de uma nova e mais agressiva variante do vírus e o colapso da rede de Manaus, que resultou em milhares de mortes em curto espaço de tempo", afirmou.

"A crise de Manaus nos levou a montar uma das maiores operações emergenciais logísticas da história (...) Foram transportados 1,6 milhão de metros cúbicos de oxigênio e equipamentos, nos permitindo estabilizar o fornecimento em 6 dias."

O ex-ministro afirmou ainda que, no começo de 2020, o país tinha capacidade de processar 1,1 mil testes PCR por dia e que, atualmente, essa marca foi elevada para 66 mil testes por dia.

"Hoje, temos registrado 46 milhões de resultados, representando 23% de nossa população testada."

Alusão ao carnaval, às eleições e ao STF

O ex-ministro afirmou ainda que o desconhecimento dos riscos da pandemia fez com que alguns gestores "mantivessem e incentivassem" o Carnaval em 2020.

"E, novamente, o desconhecimento da gravidade das cepas que circulavam pelo mundo ao final de 2020 permitiu às autoridades estaduais e municipais conduzirem processos eleitorais e festas de final de ano", afirmou.

Pazuello também afirmou que papel da União, por intermédio do Ministério da Saúde, é elaborar ações e disponibilizar recursos aos estados e municípios, que devem, então, executas as ações.

"Aos estados e municípios cabe, de forma plena, executas as ações de atenção à Saúde. A decisão do STF em abril de 2020 limitou ainda mais a atuação do governo federal nessas ações, assim não há possibilidade de o Ministério interferir na execução das ações de saúde sem usurpar as competências de estados e municípios."

Pazuello diz que não teve passagem adequada de funções

Em sua declaração inicial à CPI, antes dos questionamentos do relator Renan Calheiros (MDB-AL), o ex-ministro relembrou seu histórico à frente da Operação Acolhida, em Roraima, e destacou que um de seus principais desafios foi o fato de não ter havido uma transição, de fato, quando ele assumiu a pasta.

"Relembro que minha função inicial seria de secretário-executivo e os [15] oficiais [do Exército] para cargos administrativos e logísticos. Com a saída repentina do ministro Teich, passei a responder de forma interina, por força do cargo de secretário-executivo até setembro de 2020, quando fui efetivado Ministro de Estado da Saúde", afirmou.

"O primeiro desafio que encontramos foi de mantermos e aprimorarmos as funções do ministério, considerando que praticamente não houve a passagem de funções de forma adequada", continuou.

Primeira oitiva sem questões de ordem

O depoimento de Pazuello foi o primeiro a começar na CPI da Pandemia sem que os senadores apresentassem questões de ordem, que costumam atrasar o início da sessão.

Por volta das 9h15 desta quarta, após aprovação simbólica da ata do dia anterior, o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), convocou o ex-ministro para o início do depoimento.

O direito ao silêncio

De acordo com apuração do analista de política da CNN Caio Junqueira, mesmo com a "blindagem" garantida pelo STF, Pazuello tem dito a interlocutores que pretende falar aos senadores, aproveitando a ocasião para dar destaque ao que julga como pontos positivos de sua gestão.

O direito ao silêncio, contudo, deve ser utilizado quando seus advogados, que estarão pessoalmente com o ex-ministro, recomendarem.

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