CPI da Pandemia ouve a infectologista Luana Araújo; acompanhe
02/06/2021 11:44 em Covid - 19

Senadores querem entender a saída do cargo após dez dias da especialista escolhida para comandar a Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19

 

CPI da Pandemia ouve agora a médica infectologista Luana Araújo, anunciada em maio para o cargo de secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid-19, mas cuja nomeação foi cancelada dez dias depois.

A princípio, estava prevista para esta quarta uma audiência pública para ouvir médicos e pesquisadores contra e a favor do uso de drogas como a cloroquina no chamado tratamento precoce contra o novo coronavírus.

depoimento de Araújo foi adiantado, no entanto, para que a infectologista possa dar sua versão sobre a mudança antes de uma nova oitiva com o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.

Resumo da CPI da Pandemia:

Luana: Não tive informações de aconselhamento paralelo

A médica infectologista afirmou que não teve informações sobre aconselhamento paralelo e não encontrou ninguém que pudesse analisar que fizesse parte de um gabinete paralelo para orientar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) durante o breve período em que esteve no Ministério da Saúde.

"Eu não encontrei o presidente da República, não o conheci", disse Luana. "Eu fiquei praticamente isolada neste período e o contato que eu tive era com o ministro e com os assessores do ministro. Então, não tenho experiência para falar sobre isso.

'Tratamento precoce é discussão delirante, esdruxula, anacrônica e contraproducente'

Perguntada por Renan se em algum momento conversou com o ministro da Saúde sobre o chamado "tratamento precoce" para a Covid-19, Luana afirmou ser absolutamente a favor de terapias precoces que existam, o que não é o caso em relação ao novo coronavírus.

"Isso nem foi um assunto, senador. Essa é uma discussão delirante, esdruxula, anacrônica e contraproducente. Quando eu disse que há um ano estávamos na vanguarda da estupidez mundial, infelizmente ainda mantenho isso em vários aspectos", afirmou a especialista.

"Ainda estamos aqui discutindo uma coisa que não tem cabimento. É como se a gente estivesse escolhendo de que borda da Terra plana a gente vai pular. Não tem lógica."

Ela disse que em vez de desenvolver soluções e estratégias claras para ajudar os gestores, o país perde tempo discutindo algo que é "ponto pacificado" em todo o mundo. 

"É preciso que a gente aprenda com outros lugares, com outras instituições. A gente precisa ganhar tempo, como eu disse."

'Não foi me dada nenhuma justificativa para minha saída', diz Luana

Perguntada por Renan se seus posicionamentos públicos contrários ao chamado "tratamento precoce" para a Covid-19 – referido pela especialista como "neocuranderismo" nas redes sociais – teria causado as divergências que impediram sua efetivação, Luana disse que não recebeu uma justificativa oficial.

"Não foi me dada nenhuma justificativa para minha saída", afirmou a médica, que disse ainda que a pergunta sobre a causa de sua saída do governo deveria ser direcionada, especificamente, para o ministro Queiroga.

"Minha posição pública, absolutamente pública, não é uma opinião. Veja bem: na medicina a gente tem opinião até o momento em que a substitui por evidências. As evidências tiram da responsabilidade individual do profissional um juízo de valor sobre a situação", afirmou.

Perguntada, então, sobre o motivo para ter começado a trabalhar mesmo antes de ser oficializada no cargo, Luana disse ter recebido uma explicação de que seria necessário esperar determinado período entre a criação da secretaria e a "apostilação dos cargos" para que pudesse ser nomeada oficialmente.

"Isso deveria ser feito para que minha nomeação fosse publicada em Diário Oficial. Minha nomeação estava programada, segundo o que me foi dito, para uma segunda-feira. Não saiu. Aí ficou para uma terça-feira, não saiu. Quando chegou na quarta-feira, eu já tinha entendido o que tinha acontecido, que aquilo não ia funcionar", explicou.

"Eu trabalhei normalmente na quarta-feira até que, à noite, eu fui chamada e comunicada de que, infelizmente, com pesar, minha nomeação não sairia."

Em outro momento, ao voltar ao tema, ela afirmou que "foi simplesmente informada que a nomeação não sairia". "Eu agradeci profundamente a oportunidade de servir ao meu país, peguei minhas coisas e voltei para Belo Horizonte."

Luana: 'Sofri ameaças desde o começo da pandemia'

O relator da CPI, senador Renana Calheiros (MDB-AL), perguntou se a especialista havia sofrido ameaças após o convite para o Ministério da Saúde, como relatado à CNN pela médica Ludhmila Hajjar, após convite para assumir a pasta.

Araújo disse que não entrou em mídias sociais e não teve assessores para fazer esse tipo de acompanhamento enquanto esteve no cargo.

"Depois disso, tentaram divulgar meu endereço na internet, já tentaram dizer que eu teria ligação com isso, com aquilo. Eu não tenho", afirmou.

Ela relatou, no entanto, que como vários infectologistas do país, sofreu diversos tipos de ameaça desde de o início da pandemia. 

"Isso é algo que é extremamente lamentável pela perda da oportunidade de educação do nosso povo."

Correção de rumo no programa de testagem

Luana afirmou que, no breve período em que esteve no Ministério, foi consultora de Queiroga em vários assuntos, desde a vacinação para gestantes até o que considerou ser uma questão de extrema relevância, o programa de testagem em massa, que ela disse "esperar que seja levado adiante".

"Acho que é público que nosso programa de testagem, até este momento, é um programa com inúmeras falhas, reativo, que precisa retomar as rédeas do diagnóstico e do rastreamento de contato de pacientes – o que, infelizmente, não tinha sido levado a cabo até o momento", disse.

"Esse tipo de intervenção, de solução de problemas, é premente e foi discutido várias vezes com o ministro nesse período."

Ela disse ainda que não encontrou nenhum tipo de resistência no período em que trabalho para a pasta. "Eu entrei e trabalhei profundamente", explicou.

'Pleiteei autonomia, não insubordinação ou anarquia', diz especialista

A médica Luana Araújo afirmou, em suas considerações iniciais, que pleiteou "autonomia, não insubordinação ou anarquia" ao Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, ao apresentar suas condições para ocupar o cargo de secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid-19.

"O que o ministro me apresentou foi um projeto sólido, baseado em evidências, de superação desses obstáculos no contexto brasileiro e também a necessidade de alguém técnico e competente para conduzir esse trabalho", afirmou, ao senadores da CPI da Pandemia.

"Sua apresentação foi consonante aos meus valores, que claramente apresentei a ele: aceitaria o convite para essa posição conquanto me fosse garantida a autonomia necessária e sempre fossem respeitadas a cientificidade e a tecnicidade."

Araújo disse ainda que "ciência não tem lado". "[Ciência] é bem ou mal feita. Ciência é ferramenta de produção de conhecimento e educação para servir à população, priorizando a vida e a qualidade de vida", afirmou.

Ela afirmou ainda que a Covid-19 é uma "doença ardilosa", mas que a pandemia é uma "crise de confiança". 

"É imperativo que deixemos o que não presta mais de lado e busquemos uma solução para o que estamos vivendo. A cada diz que lutamos uns contra os outros, o vírus vence", disse a médica. 

"Eu me recuso a ficar calada um minuto além desses 320 dias. Fiz e faço minha parte, assim como muita gente decente neste país."

Breve passagem pelo governo

Em evento no dia 12 de maio em que sua nomeação foi anunciada, a médica disse que iria "coordenar a resposta nacional à Covid-19, em diálogo permanente com todos os atores". 

Dez dias depois, em nota, o Ministério da Saúde afirmou que a pasta buscava "outro nome com perfil profissional semelhante: técnico e baseado em evidências científicas".

A convocação de Luana Araújo foi requerida pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Humberto Costa (PT-PE) após o cancelamento da nomeação dela para a secretaria.

“Isso aconteceu muito recentemente e ainda há dúvidas sobre o que fez o governo, o Ministério da Saúde, ao não nomear efetivamente essa pessoa. Há rumores de que seria pelo fato de que ela questiona vários pontos da condução política que o governo tem dado ao enfrentamento da pandemia”, disse o senador petista.

Reagendamento da pauta anterior

Na reunião da CPI na terça-feira (1º), o senador Marcos Rogério (DEM-RO) apresentou questão de ordem contra a mudança de pauta, alegando ser "intempestiva" e "desrespeitosa" com os depoentes anteriormente previstos. 

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), pediu desculpas pelo transtorno causado aos médicos previstos para serem ouvidos pela comissão, mas alegou que a CPI "é muito dinâmica" e manteve a oitiva de Luana Araújo.

Os senadores Luís Carlos Heinze (PP-RS) e Eduardo Girão (Podemos-CE) pediram, então, que as audiências canceladas sejam remarcadas.

Para falar contra esses tratamentos tinham sido convidados os médicos Clovis Arns da Cunha e Zeliete Zambom. Para defender o tratamento, a comissão ouviria os médicos Francisco Eduardo Cardoso Alves e Paulo Márcio Porto de Melo.

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